Se você quer mesmo saber o que me impede de tentar isso de novo, a explicação é muito simples: Eu estava lá.
Eu estava lá. Eu ouvi tudo o que você disse. Cada frase dura que você repetia enquanto me via desmoronar. Eu me lembro do seu olhar opaco, do seu timbre todo formal, da sua face pálida, da sua testa franzida, das mãos frias segurando o meu rosto.
Eu estava lá. Eu vi sua expressão, nela só havia um misto de pena e indiferença, não havia nada do amor, não havia nada da paixão, nada havia nada. Eu estava lá e por instantes duvidei do que saía facilmente daqueles lábios que até então só tentavam me roubar mais um beijo antes das nossas breves despedidas.
Eu estava lá e pensei que você estava fora de si, que tinha usado alguma substância alucinógena ou que tinha enlouquecido de vez. Não. Você foi bem claro, e frio, e cruel. Não demonstrou o mínimo da consideração que eu achei, inocentemente, que tinha conquistado até ali. Eu estava lá na noite após a conversa final e em todas as seguintes.
Eu estava lá na insônia, na falta de concentração na aula, no travesseiro molhado, na caixa de chocolate devorada, no rosto borrado, nos copos a mais, nos pratos a menos, nos quilos perdidos, nas várias recusas aos convites interessantes e no pensamento recorrente que vivia a buscar uma explicação pra isso tudo.
Eu estava lá em cada minuto que eu olhava para tela do celular esperando que alguma mensagem ou ligação surgisse, nos eventos em que me perguntaram “por que ele não veio?”, quando meus amigos diziam que logo você se arrependeria e nas cenas que passavam como um filme na minha cabeça e que insistiam em só mostrar a melhor parte de nós.
Eu também estava lá quando notei que uma pessoa que se mostra feliz sem mim, não merece o meu luto, quando passei a pensar cada vez menos em você e quando os momentos de riso superaram os de saudade. Eu estava lá quando aprendi que uma vida sozinha pode ser tão bonita quanto uma vida a dois, quando me permiti fazer coisas diferentes e conhecer pessoas novas e quando compreendi que você era só mais um cara que aparece pra gente ver o que não quer.
É por isso que eu não volto. Por favor, entenda. Eu fui sem vontade, sim. Mas enquanto eu ia, me encontrei e agora, cara, só ando pra frente. Que fique bem claro que não é por orgulho, medo ou alguma vingancinha besta. Eu já passei dessa fase faz tempo. É que eu estava lá, você não. E embora eu acredite em todo esse seu arrependimento, é muito tarde. Você me deixou sozinha e eu descobri que me viro melhor sem você.
Você está errado quando diz que eu estou desistindo do amanhã que a gente tanto planejou. Ainda imagino o futuro, só que agora é um pouco diferente: Eu estou lá, você não.
(Jessica Delalana)
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